as portas largas da casa de madeira estavam todas abertas
permitindo que o ar fresco daquela manhã de "sabe-se lá que mês, ano ou
dia" entrasse e percorresse os corredores vazios da minha morada.
nos fundos dessa casa eu aguardava
sentada, em um degrau que dava para o nada. que dava para o fim.
mas tinha um pequenino lago ali, e eu lhe
aguardava olhando aquela água imóvel.
como eu.
a música que em um mês de maio você
escreveu pra mim tocava, mas somente nos meus ouvidos e lembranças.
vinhas de longe, por minha própria culpa
partiu.
e agora com teu retorno anunciado pela luz
da manhã daquele dia, eu lhe esperaria.
e já havia preparado tudo para que muito
bem recebido fosse, e jamais partisse.
mesmo sabendo que sua estadia por aqui,
pelos corredores e quartos e cômodos e camas seria breve pois eu já não
brilhava mais.
relevando tudo isso, levantando a cabeça
sozinha naquela casa vazia e escutando uma música que apenas eu ouvia, deixei
que as boas energias da natureza ao redor entrassem para dentro desse lar que
eu queria que tu morasse.
o sol, as folhas das árvores, o cheiro do
mato, o gosto terroso da fruta retirada direto do pé. as flores, o lago, a
terra úmida, o perfume que a chuva mansa que caiu na madrugada deixara nesse
ambiente...
os elementos preparados para sua recepção.
fiz o que pude.
então me vesti com aquele vestido amarelo
e flor.
deixei que o cabelo fino e liso secasse e
se penteasse sozinho ao vento.
sai nessa manhã descalça após um banho
quente e ali fiquei.
somente a esperar.
era tarde.
esperei esperei esperei
e você não vinha.
esperei que me buscasse para que juntos
fossemos embora.
mas por ali permaneci, e o teu rosto eu
jamais voltei a ver.
sentada naquele degrau que dava para o
nada mais infinito que já vira, eu deixei que o vento trancasse as janelas e as
portas. que a escuridão percorresse os corredores e destruísse tudo de luz que
havia dentro desse lugar.
nenhum sopro, nenhum lampião
nenhuma esperança ou espera.
deixei-me a sós nesse lugar, esperando que
a nova vida que brotava por entre as árvores, que brotava de dentro de mim, voltasse a me fazer
sorrir. um dia.